Crítica | Morto Não Fala (2019) - Um turbilhão de angústias em uma das melhores experiências do terror nacional nos últimos anos
Um platonista noturno do IML, enigmático, capaz de conversar com os mortos que estão à sua volta nas macas frias. A trama nos apresenta a Stênio, um homem desajeitado, de semblante cansado devido ao trabalho duro dentro do necrotério, que ao chegar em casa, tem que enfrentar as murmurações da mulher, Odete, mãe de seus dois filhos. Ela o culpa por não ter mudado de vida, o despreza e reclama do cheiro de morte entranhado em suas roupas. Numa dessas ocorrências, a vida de Stênio muda, mas para pior. Ele acaba tendo que lidar com situações inesperadas. Se eu contar o que presenciei, além dos corpos expostos com uma realidade impressionante, estragarei sua experiência, mas cabe a mim, dizer que o longa é impecável dentro da sua proposta.
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Reprodução: IMDB |
A
direção fica a cargo de Denisson Ramalho que consegue conduzir a
trama com maestria. Os ângulos escolhidos, como o dutch angle que é
usado para dar a sensação de desinstabilidade.
Os enquadramentos fechados que nos faz sentir a sensação
claustrofóbica que o personagem também está vivenciando. O jump
scare acontece
em ocasiões pontuais.
Continuando
com a direção,
a de fotografia é um elemento que casa perfeitamente com
as
várias transições de cena. Quando Stênio está no necrotério,
por exemplo —
vemos
uma paleta de cor esverdeada, indicando a solidão e vazio existente
no
ambiente.
Em outros momentos, na casa do personagem, tons de vermelho para
pontuar a fúria, o delírio e a própria morte que cerca Stênio e
sua família. As atuações são boas, apesar de os garotos que
interpretam os filhos de Stênio podiam
ter
sido melhores. A
menina
não me convenceu. Destaque para Daniel de Oliveira, que faz um
excelente trabalho na pele do legista, hora, louco e imaturo, outrora
como herói da
família.
Bianca Comparato mostra-se eficiente, mas isso somente nos minutos
finais da trama. Fabíula Nascimento está bem no papel da esposa,
mas em certos momentos dramáticos, ela peca por ser dramática
demais (vocês entenderão).
O
longa tem seus errinhos, como toda e qualquer obra. Posso citar o
exagero de CGI no rosto dos mortos, quando eles estão conversando
com Stênio. Particularmente, tenho sérios problemas com o mau uso
do CGI (a la DC/Warner), mas, eu decidi aceitar, uma
vez que os
efeitos práticos superam este pecado gravíssimo. Ao vermos as
partes
de corpos expostas, muitos litros de sangue (falso, ok), e toda a
bagunça instalada no necrotério, em certo ponto, acreditei está
assistindo cenas reais e até pensei sentir o cheiro que exalava lá
dentro. Além de causar medo, Morto Não Fala, traz críticas
pertinentes a nossa sociedade, como calúnia, solidão, violência
urbana, traição e uma série de signos que ao assistir você irá
se deparar.
O
filme é baseado em um conto do jornalista Marco de Castro. A
narrativa é corrida, cheia de ação e o final é satisfatório mas
não é algo destrinchadinho, mesmo
porque, geralmente, contos deixam finais em abertos para
interpretações, o que aprecio. Não
poderia
deixar de comentar que o roteiro não se preocupa em explicar porque
Stênio fala com os mortos, ele apenas fala.
É
aceitável, não é algo forçado, e a trama não se prende a estes
pormenores.
Morto
Não Fala é
um dos melhores filmes nacionais do gênero terror que já pude
experienciar nos últimos anos. Mesclando o terror psicológico ao
famoso gore, somos jogados em uma atmosfera de estranheza e loucura.
Digno de produções hollywoodianas e até melhor que algumas delas.
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